A gravidez na adolescência é um tema que requer um olhar multidisciplinar e intersetorial. Por isso tem sido objeto de difersas pesquisas, estudos e políticas públicas.   O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, elenca diversos direitos, entre eles, o direito à vida e à saúde. O ECA também estabelece a necessidade de campanhas frequentes de informação sobre tais direitos. Em cumprimento a isso, a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência, estabelecida pela Lei nº 13.798/19, é um momento importante de divulgação, informação e debates sobre o tema. Realizada sempre na primeira semana de fevereiro, o período foi escolhido para aproveitar a proximidade com o carnaval para divulgar, por exemplo, métodos contraceptivos. A Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência também está alinhada com o ODS 5, um dos 17 objetivos da Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável. Este objetivo busca alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas, assegurando o acesso universal à saúde sexual e reprodutiva e aos direitos reprodutivos na medida em que elas possam tomar decisões informadas sobre suas relações sexuais, uso de contraceptivos e cuidados com saúde reprodutiva.

A vulnerabilidade na adolescência

A adolescência é um período de grande ebulição hormonal, curiosidade, descobertas e ao mesmo tempo, de muita insegurança com relação à aparência, ao futuro relacionado a estudo, trabalho e renda. Por isso, é também uma fase de alta vulnerabilidade. Por exemplo, com relação à violência e à segurança. De acordo com o Atlas da Violência no Brasil, publicado pelo IPEA em 2023, a cada vinte minutos um jovem é assassinado no Brasil. No que se refere à gravidez na adolescência, segundo o UNFPA (Fundo de População das Nações Unidas), o Brasil é um dos países da América Latina com a maior prevalência. Em 2020, 14% dos nascidos vivos no Brasil foram gerados por mães adolescentes. De acordo com o Estudo Saúde Brasil do Ministério da Saúde (2018), a imaturidade biológica e as condções socioeconômicas influenciam no fato de uma das maiores taxas de mortalidade infantil acontecer entre mães adolescentes. Meninas com menor escolaridade, menor renda, menor acesso a serviços públicos e em situação de maior vulnerabilidade social são as mais propensas à engravidar, conforme demonstra estudo realizado em 2018 pela  Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).

Causas, riscos e consequências

As iniquidades sociais, desigualdades de gênero e étnico-raciais, combinadas com a falta de informação, de diálogo aberto, de uma rede de apoio social e de acesso à saúde sexual e reprodutiva, são consideradas os principais fatores de risco para a gravidez não intencional na adolescência. Além disso, a falta de perspectivas de futuro e de projeto de vida para que estes adolescentes sigam seu desenvolvimento de forma saudável é também uma causa da gravidez precoce.

Ao engravidar, cerca de 20% das adolescentes deixam de estudar, segundo pesquisa do EducaCenso 2019. O impacto  da falta de estudos impacta na geração de renda, afetando a independencia financeira, e, como consequência, expondo as adolescentes a um ciclo vicioso de violência social. Além disso, os riscos para a saúde são o aborto espontâneo ou provocado, o nascimento prematuro, a anemia, a elevação da pressão arterial gerando eclampsia e a depressão pós-parto, entre outros. 

Com o objetivo de apontar as situações de vulnerabilidade presentes nas vidas de parte das meninas que vivenciam a maternidade na adolescência, o Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (CIDACS – Fiocruz Bahia), o Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA) e o UNFPA Brasil publicaram a cartilha “Sem Deixar Ninguém para Trás: gravidez, maternidade e violência sexual na adolescência”. O material é um importante instrumento para que diferentes organizações sociais possam aprofundar seus conhecimentos sobre o tema e incidir com maior propriedade em seus territórios.

Prevenção e educação

A informação, a educação e o empoderamento para o exercício pleno dos direitos de cidadania são fundamentais para prevenção da gravidez na adolescência. Para além da informação de diferentes métodos contraceptivos, a educação sexual precisa abordar as relações afetivas, o respeito, a responsabilidade e a autoestima. 

Julgamento e preconceitos

Em muitas situações a gravidez é desejada e deve ser respeitada e aceita socialmente, sendo a maternidade seu projeto de vida. Por isso, os profissionais que lidam com o público adolescente, sejam eles professores, médicos, enfermeiros, assistentes sociais ou voluntários de organizações sociais, precisam estar abertos à escuta, ao diálogo sem julgamentos, ao acolhimento levando em consideração a diversidade de classe, gênero, raça/cor e demais vulnerabilidades sociais.

Direitos Reprodutivos

Os direitos sexuais e reprodutivos fazem parte do artigo 98 do  Estatuto da Criança e do Adolescente e de diferentes normas técnicas estabelecidas pelo Ministério da Saúde. Entre eles, o direito ao sigilo, a obter informações adequadas sobre métodos contraceptivos, a buscar atendimento médico quando houver ruptura do preservativo ou quando a relação sexual for desprotegida por falha no uso da camisinha ou por violência sexual. É também seu direito ser acompanhada por médico, pediatra, ginecologista periódicamente. É fundamental lembrar que nenhum método contraceptivo é 100% e que a dupla proteção de uso do contraceptivo e de camisinha devem estar sempre associados. O aborto ainda é um assunto tabu no Brasil, especialmente com relação aos preceitos de certas religiões. No entanto, aborto é sempre uma questão de saúde pública e uma questão de justiça. Mas quem tem direito ao aborto? Meninas com menos de 14 anos, quando a gravidez coloca a vida da mãe em risco, quando o bebê não tem cérebro e quando não houve uso de camisinha apesar de solicitado pela mulher. Nesses casos, não precisa nem de boletim de ocorrência. Muitas mulheres desconhecem que em tais situações o aborto é legal, garantido pela lei e realizado pelo sistema de saúde público. Saiba mais sobre direitos reprodutivos aqui.

O que as organizações que atendem mulheres e adolescentes podem fazer para ajudar?

Rodas de conversa, bate-papo com médicas, orientação individual, cartilhas. Cada instituição tem sua metodologia e ferramentas para realizar um atendimento. No caso da temática em questão, quanto mais descontraído for o ambiente, mais a vontade para tirar dúvidas as pessoas ficam. Usar imagens e modelos de anatomia do aparelho reprodutor também pode ajudar. 

No Instituto Dara, por exemplo, o atendimento médico passa por compreender a situação da família e construir junto com ela um plano relacionado aos direitos reprodutivos, informando sobre suas opções, orientando quanto ao acesso aos recursos públicos de saúde e acompanhando a saúde dos membros da família, qualquer que sejam suas decisões. Além disso, acontecem rodas de conversa que fazem parte das ações de atendimento das equipes de saúde e de educação. Cientes da importância da educação sexual e dos direitos reprodutivos, as equipes convidam médicos e profissionais de atenção básica da saúde do sistema público para conversas. São momentos para, por exemplo, apresentar o preservativo feminino distribuído gratuitamente pelo SUS. 

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