Maternidade Atípica: Definições e Contextos
Antes de mergulharmos nas nuances da maternidade atípica, é importante definir o que significa este termo. Ele refere-se a mães com filhos neuroatípicos, ou seja, que apresentam algum transtorno ligado ao neurodesenvolvimento, como o transtorno do espectro autista (TEA). O termo “espectro” significa que existe uma diversidade de sintomas e níveis de gradação de sintomas e aspectos, resultando que cada indivíduo apresenta um conjunto próprio de manifestações. Tais gradações passam, por exemplo, por dificuldades no domínio da linguagem, pelo padrão de comportamento restritivo e repetitivo ou pela dificuldade de socialização, entre outros, comprometendo a interação social em função de uma condição neurológica.
As mães de filhos diagnosticados dentro do espectro enfrentam uma realidade diferente da maternidade idealizada, o que pode gerar um sentimento de luto ao compararem a diferença entre o filho imaginado e a realidade de uma criança com TEA.
Desafios da Maternidade Atípica
Embora a maternidade atípica apresente desafios únicos, também traz uma série de recompensas e oportunidades de crescimento pessoal. Essas experiências desafiam as normas convencionais e expandem nossa compreensão do que significa ser mãe. No entanto, é importante reconhecer que as experiências de maternidade atípica não são homogêneas e podem variar amplamente de pessoa para pessoa.
Muitas mães de crianças diagnosticadas dentro do espectro autista experimentam um sentimento de solidão. A sobrecarga física, econômica e emocional é enfrentada sobretudo pelas mães, que na maioria das vezes assumem toda a responsabilidade pelos cuidados. Preconceito da família e da sociedade, estereotipação, descaso que muitas vezes ocorre tanto em estabelecimentos de saúde quanto educacionais, falta de informação geram culpa, medo, frustração, angústia, tensão física e emocional, complicando ainda mais o estresse materno.
É importante reconhecer que nem todas as mulheres têm acesso igual a opções de maternidade não tradicionais. Fatores como raça, classe social, orientação sexual, identidade de gênero e local de residência podem influenciar significativamente as oportunidades disponíveis para as mulheres em suas jornadas maternas. Portanto, é essencial abordar as disparidades de acesso e trabalhar para criar sistemas mais equitativos que garantam que todas as mulheres tenham a oportunidade de exercer sua autonomia reprodutiva.
O que as organizações sociais podem fazer para apoiar a maternidade atípica?
A maternidade atípica é uma realidade complexa e multifacetada que desafia as normas convencionais da maternidade. Ao explorar uma variedade de experiências, desde a maternidade solo até a maternidade de filhos portadores de deficiência, podemos ampliar nossa compreensão da diversidade e complexidade da experiência materna. É crucial reconhecer e valorizar todas as formas de maternidade, garantindo que todas as mulheres tenham acesso a apoio e recursos adequados para criar seus filhos da melhor maneira possível.
No Instituto Dara, buscamos promover a proteção e a garantia de direitos das pessoas dentro do espectro e outras deficiências por meio do acompanhamento, orientação e encaminhamento das famílias para a rede de atendimento.
Durante o Aconchego familiar, momento de reunir todas as famílias atendidas na instituição, a equipe busca promover conversas, trocas de experiências e trazer informações que possam auxiliar na busca por soluções. Ao longo da jornada de permanência das famílias no Instituto Dara, uma rede de apoio é formada e fortalecida. Mães que compartilham experiências semelhantes podem encontrar apoio, solidariedade e dicas de como enfrentar determinados problemas.
“Ser mãe de autista é lutar todo o dia, aprender todo o dia.” Essa foi a fala de Laura, mãe de uma criança diagnosticada dentro do espectro autista, durante um dos encontros do Aconchego realizado no Dara. A roda de conversa contou com a mediação da assistente social e professora do curso de Serviço Social, da UFRJ, Cibele Henriques, também uma mãe atípica.
Muitos assuntos foram abordados, desde a negação dos próprios pais e demais familiares com relação ao diagnóstico; os desafios para mães trabalharem, informalmente ou não; a dependência do SUS e as filas para atendimento e diagnóstico; o preconceito e capacitismo; o tratamento contínuo e sistemático; patologização e medicalização, mobilidade urbana e custo para o transporte público no acesso aos tratamentos; alternativas de tratamento com canabidiol; o direito a ocupar espaços públicos; a falta de mediadores nas escolas (previsto na LDB) e de Plano de estudos Individual para crianças dentro do espectro; professores que gritam (crianças dentro do espectro tendem a ser muito sensíveis a ruídos altos), a diferença entre maternidade e maternagem (cuidado mesmo que sem relação sanguínea); políticas públicas e participação para mães e pais atípicos.
Todos os temas são desafiadores, mas apontam para a necessidade da busca de soluções a partir da rede de apoio. Desta forma, ao identificar os problemas e pensar saídas, as organizações sociais e profissionais que nela atuam podem buscar outras organizações, órgãos públicos e profissionais que possam fazer parte da rede de apoio das mães atípicas. É uma rede de apoio fortalecida e atenta que poderá dar suporte a estas mulheres para que a experiência da maternidade seja menos dolorosa e que elas possam se sentir menos solitárias no cuidado com os filhos.
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